quarta-feira, janeiro 14, 2004

Todos os dias olho para mim sentado nesta cadeira e pergunto-me: "O que estou eu a fazer AQUI?"

Quero tocar em granito! Quero sentir a sua pele áspera na ponta dos meus dedos que tacteiam á procura da superficie agora lisa de uma gravura rupestre!
Quero estar perdido no meio de uma mata de pinheiros, ouvindo os estalidos da caruma sob os meus pés, pontapeando aqui e ali uma pinha caída sobre aquela turfa repleta de vida minuscula.
Quero trepar a paredes íngremes, quero enfiar-me num buraco apertado á procura de um caco. Quem sabe não dou por mim num pequeno abrigo pré-histórico.
Quero descer uma vertente de uma serra acentuadamente inclinada, descer para sentir os musculos tensos e doridos só de descer, e no final encontrar um rio de água gelada em que entro sentindo a pele a queimar, a subir.
Depois quero trepar por uma serra, saltitando por afloramentos graniticos cobertos de pátine e de densa vegetação, onde os meus braços me valem mais do que as pernas, soerguendo-me através de ramos e giestas, e no cume dessa elevação fumo um cigarro enquanto os meus olhos extasiados se perdem na linha da perfeição que o horizonte animado de verde me oferece.
Quero sentir o cheiro de lenha a queimar, que sugado pelo pescoço de cavalo das chaminés das lareiras de pedra enegrecida, faz da seiva o incenso que se espalha pelas pequenas localidades, tornando ainda mais lúgubres as suas tonalidades.
Quero encontrar os velhos de rugas simpáticas e roupas grossas a atravessar uma estrada vagarosamente, como quem lembra que a vida deve ter a sua calma e que tantos anos depois eles sabem reconhecer que a pressa nunca lhes trouxe nada.
Quero chegar ao final da aurora já de corpo rebentado! Dorido e feliz, penso no medronho que vou beber na tasca do Ti António ao ritmo do descascar de bolotas. O alcool liberta o seu calor, assim como a fatiga, e um imenso regozijo enche-me os lábios ao pensar: "que bem que eu vou dormir"
Quero sentir o aroma doce e mineral da terra nas minhas mãos! Quero sentir-lhe a humidade, procurar-lhe o calor, e encontrar nela o que de mais bonito os meus olhos sabem ver!

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