sexta-feira, janeiro 20, 2006

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Quantas vezes se ergueu o sol sobre os meus ombros, que o mundo se assombrou por mim?
Poucas vezes sou eu, o filho vetusto, mordedura de cabra me moldou.
Falo de mim mesmo, se de outro poderia dizer pior. E não pensem que fico sem resposta. Cravarei os dentes nos meus dentes caso me desagrade, por tudo juro que rebentarei por dentro, por tudo e porventura, por um dia de chuva no ventre de uma tempestade.



Nas dobras de um pano velho instala-se uma nova comunidade.
Vêm das terras raras.
Trazem consigo um ente sagrado, como um bispo ou um cardeal. Uma espécie privilegiada, capaz de adivinhar o futuro e respeitar o passado. Tais entes, sentem profundamente a frescura de uma Gota caída de uma folha matinal, sem nunca se esquecerem dos prazeres do queijo. Apesar da sua grandeza gigantesca, não se coíbem a prostrarem-se ao chão de olhos arregalados com alguma singela beleza que passa. Pequena, como que a tentar passar despercebida.
Seja facto, quem a percebe!? Como entender algo tão pequeno? Toda a grandeza que encerrar será fraca medida! Todos os filhos que tiver serão mais pequenos, inúteis, do que ela, como aves sem asas e bico para comer. Reparem, é como estar por cima, de olhos pendurados como um céu, e descuidadamente escorrer pelos mesmos batoques, caindo em algo menor. Ali, no reboliço das folhas com tons outonais, um sopro quase quente, quase gélido, arrepia qualquer bispo, qualquer Papa, fazendo-os acreditar. Constrói-se! No meio do estrume diário regista-se o milagre da fé, cada vez mais raro. É esse nosso lado humano que ressalta nas fendas das mãos que se abraçam. Afinal de contas, são irmãos, têm a mesma carne, e o mesmo sangue. Juntas, são como o cálice, elas são o Graal. Destrói-se! Qual será a sensação de uma pele arrancada ao seu corpo, que dores exultaram daí? Mas não procuro o lado da vítima. Procuro o alfaiate, o alforgeiro, albardeiro, alarve, alarvado, acuso a fábrica, o ventre, a placenta mal formada, e o atilho que trazia tal veneno.
Ah, dia mal tecido nos teares de Clotó!
O facilitismo preponderante da acção nunca se acometeu a ser remediado pelo pragmatismo. Nem por sonhos, nem por ideais se completou de continuidade o desejo, terminando sossegadamente ao destapar de uma nova descoberta. E, sempre quando tão perto da resposta!
A 8 de Outubro de 1926, eu ainda não era nascido. Cem anos antes não acontecia em Portugal nada de extraordinário pelos registos, sucediam-se apenas as Eleições para a Câmara dos Deputados. O certo é que a23/25 de Outubro, estalava a guerra civil que desaguaria na Independência do Brasil. O certo é que nesse século, Cézanne pintava o “Homem com Chapéu de Palha”; Korsakov compunha, “Ivan, o terrível”; e Rimbaud Escrevia “Uma Época no Inferno”. Rimbaud tinha 17 anos. A única semelhança comigo...o nome “Artur”. Garanto-vos!
É enigmático o tempo, sobretudo aquele que nos percorre.
Pode um Dia ser tão importante para nós, com outros tantos a surgir como insignificantes, e se os anos também podem ser assim, já oiço perigosamente dizer o mesmo das vidas. Nada a ver com grandeza ou pequenez! Não se prende esta coisa, este processo, este andar pelo mundo, somente de quem se fala na história, nos media, nos acervos e epígrafes. Há algo mais democrático, há algo mais de eterno no transitório. Uma pegada. Um montículo sob o húmus. O nome que se deixa para alguém. Tanta história esquecida. Tantas lutas. A estranheza das nossas veias. O Nariz que não tem igual. Tantas lutas, tantas que é para isso que nos servem os dias! Para lutar contra nós próprios e contra a história. Contra o tempo.

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