sexta-feira, janeiro 02, 2004

Coimbra

Chegou a nostalgia. Já não é a primeira vez, confesso.
De quando em quando a memória prega-me destas partidas.

Tenho saudades daqueles tempos.
As preocupações eram poucas naquela altura. TInha de frequentar as aulas, tarefa árdua, e de ir arranjando bibliografia. Ler a maioria dos artigos não era um esforço, tirava-se prazer.
As cantinas das amarelas sempre cheias de gente com os seus azulejos de cantina. "Hoje é hamburguer!"-"epá, vamos ao snack das Ás". E lá vinham as piadas sobre a comida, comentando a coincidência da ementa com o facto de não ver os habituais vira-latas pelas ruas da Universidade.
Fim de tarde no Pinto. Juntava-se a conversa á conversa. Por vezes começavamos com uns copos de traçadinho(que hoje já não conseguimos beber) e a noite ganhava mais horas. Cantava-se. Jogava-se dominó(raramente). Falava-se acerca de tudo.
Ruas estreitinhas, calçadas de pedra negra, onde o nevoeiro tinha de se apertar para passar. O perigo de dar um belo tralho estava sempre presente na série de ruas ingremes. Tenho-as no meu mapa mental e vão todas dar á Sé Velha.
Capas negras parecem-me completamente vulgares. Ninguém estranha uma capa em Coimbra. É uma terra de super herois, mas de capa, á moda antiga.
Estou a ver as caras conhecidas do Académico e do Tropical. Ainda venho com o corpo quente da sessão de matrecos que desmoeu o jantar.
Alguém começou a falar acerca do castrejo no norte de Portugal. "quais foram os artigos que leste?"
Está na hora do ensaio. Esta tertúlia, esta in vino, com estes cromos menos popularuchos que as outras tunas...
As escadas da associação...ouve-se um eco de musica perdida entre os corredores e a algazarra do café.
Combinei com a malta no piano. Que saudades do Dixie. Porque fecham bares como o Califa ou uma disco como o States (hoje mais um estabelecimento da Passerelle..enfim)?
Depois de sair do Couraça, já passa das duas, lá vamos para o Dixie, entre o nevoeiro, extasiado com a visão do Mondego. Vou a ouvir o João Nuno a falar, o tipo não se cala mas é bom assim, gosto de o ouvir, este fervoroso comunista de Alcoentre. Meu caro amigo.
"O Mondego é lindo" diz o seca-adegas a mijar a sua bebedeira contra um muro da couraça. E de facto é mesmo, sóbrio ou embriagado. O Mondego claro.
Saudades das mulheres que beijei. Saudades dos olhares que me prenderam e me arrastaram pela cidade. Saudades das duas maiores mulheres da minha vida. Como é bom amar em Coimbra!
Saudades da estudantalha bêbada e ruidosa.
Os meus sapatos faziam sempre aquele "squick squick" pelos corredores da faculdade de letras.
"Dona Milu, onde estão as actas do II Congresso Peninsular...?"
Tive colegas fabulosos. Pessoas lindissimas e interessantes.
Parávamos a meio do Quebra Costas para ler o jornal "Insólito".
Fumou-se uns charritos entre as escadarias escuras das quimicas. Cantou-se fado na escadas da Sé Nova. Correu-se para as aulas nas escadas guardadas pelas bolas do D.Dinis, as "Monumentais", onde ecoavam esvoaçando palavras de ordem contra os diversos ministros da educação. "depois do Coito vem o Leite"
Festas de Erasmus
Encontros de Fotografia
Queima das fitas
Latada
Cinemita no Avenida
Um livro numa esplanada
Um concerto na cave das quimicas
Um fado para a Lua
Os velhos numa tasca
3 minutos para o exame
Caras bonitas enchem-me o olhar
Café no Santa Cruz
Jantarada lá em casa
Jantar de curso
Já estou atrasado para entregar este trabalho
Monsieur George e a Maria
Dona Adelina e o Sr. Pinto
O meu velho Caco
Um encontro na Prakistão
Castanhas assadas no Cartola
Teatro no Gil, quando por fim abriu
Trajado num jogo da Briosa
Uma ressaca naquele quarto velho da Guilherme Moreira
Feijoada num camping gáz na Sá da Bandeira
O raio do Antunes fez-me a vida negra
O Brázio com a sua voz maravilhosa bêbado como um cacho, vomitava o chão das amarelas. Pobre caloiro...
Tenho saudades tuas meu amigo, que bom era ver-te cheio de vida sempre a tentar resolver os teus problemas com as mulheres. "Artur, eu não tenho culpa, desde que tive o acidente e fiz fisioterapia as minhas mãos não conseguem ficar quietas", agora as tuas mãos ganharam sossego forçado. Puta de vida
Saudades dos pasteis de carne quentes, ás 5 da manhã na rua da moeda.
Saudades de tanta gente, de tantos amigos!
Ri-me tanto!
Também chorei!
Por ti gritei, tornado louco nas ruas quase vazias de Coimbra.
Coimbra, Coimbra, Coimbra.

Nunca haveria espaço em lado algum para falar sobre tudo o que vivi em Coimbra! E tenho muitas saudades disso!

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